Mudou. Mudaram os viventes. A terra já não ronca. Geme. O
capim avançou levando de roldão as matas do cerrado, mexendo nas veias das
águas puras e límpidas, filtradas pelas montanhas de calcário.
A água, ainda abundante, que serve para saciar não apenas os
animais, mas
também a nós, os mais ferozes predadores, arvorados de
humanos, também está ameaçada pelo veneno jogado em abundância no planalto. As
águas dos rios que servem para afogar a nossa sede e afagar os nossos corpos,
correm o risco de se transformarem em veias de venenos, mortos e amordaçados.
Seu Marcelino, seu Nego, nascido e criado na região
confidenciou que, o ria das Pedras que corre a poucos metros de nossa casa,
hoje talvez tenha apenas a metade da água que tinha em tempos idos
Nas garras do agronegócio: veneno e
destruição
Nos últimos anos houve um avanço assustador do maior
predador, o humano ser.
“Os gaúchos”
como são genericamente conhecidos na região, avançam que gafanhotos sobre as terras planas do
planalto e suas plantações nativas. Rasgam os ventre da terra como se elas
fossem criaturas suas. Sem dó nem piedade suas enorme máquinas vão semeando o
colhendo milhares de toneladas de soja e algodão.
Se bebíamos a água do Rio das Pedras, por exemplo, despreocupadamente, em certos
períodos do ano, especialmente quando acontecem as pulverizações das
lavouras, já nos preocupamos com as
possibilidades de estar sendo atingido pelo veneno.
Atraídos para a Bahia
A população de Terra Ronca vai sendo atraída para a Bahia,
atrás do ronco ensurdecedor dos dentes de ferro que se alastram sobre
aquela região. O boi sob cujas patas a região foi ocupada, já não segura mais
ninguém. Passando um boi, passa a boiada. Os jovens, ávidos pelos bens
anunciados pela sociedade de consumo, correm para os braços dos novos
bandeirantes atraídos pelo imã desenvolvimentista do agronegócio. Resta
resisitir. Rezar, talvez. Mas acima de
tudo sonhar. Não perder a esperança de que é possível construirmos um Brasil
diferente.
O Parque Estadual de
Terra Ronca
E suas contradições e incompreensões. Criado dentro da política de preservação, o
parque revela suas ambiguidades uma vez que não conseguiu apresentar
alternativas de sobrevivência com dignidade, para a população mais pobre, que
vive como peões ou pequenos criadores de gado.
Por esta razão o Parque é
considerado por parte dos ativos como um retrocesso na política de
desenvolvimento da, região, baseado na pecuária. Esse fato tem propiciado um
expressivo êxodo para as cidades.
Como na maioria dos parques e unidades de conservação os
estados e governo federal não conseguem implantar uma efetiva política de
proteção ambiental. Inúmeras fazendas continuam suas atividades dentro do
parque por não terem sido ainda indenizados, para se retirarem da área.
Mas Terra Ronca continua tendo seu charme, beleza e
mistério. As belezas naturais de suas grutas com enormes salões divinamente
ornamentados com estalagmites e estalactites continuam acessíveis aos comuns
dos mortais. Ainda não caíram nas garras do turismo emp
resarial. Continuam como presente de Deus a todos os amantes da natureza.
Egon Heck e Laila Menezes
Brasília, 20 de junho de 2017