Quase uma década de tribulação, tormento e desassossego
permanente. Talvez seja a comunidade Kaiowá Guarani da Terra Indígena Passo
Piraju, emblemática de uma comunidade indígena sitiada, cercada de soja, cana e
ódio. "Reduzidos sim, mas não vencidos", diziam comunidades indígenas
da Amazônia, quando da Marcha e Conferência Indígena do ano 2000.
Neste período vi as lágrimas deslizando no rosto de
Carlitos, ao narrar tudo que passou nas décadas de luta pela terra e vida de
seu povo. Ele recebeu a visita de dezenas de personalidades e delegações de
Direitos Humanos e aliados, do Brasil e do mundo. Narrou com a mesma dignidade
e fidelidade os acontecimentos, desde a expulsão de seu pai e comunidade do
Passo Piraju, da área onde hoje se encontram.
A pergunta crucial que fica é o que se quer de fato dos
Kaiowá Guarani. Serão os sete palmos de terra, para consumar de vez o genocídio
nunca estancado? Para os arautos dos decretos e
praticas de extermínio é muito mais importante ampliar as
lavouras de soja, uma vez que na bolsa de valores a cotação do grão maldito
está alto, bem acima da vida de qualquer indígena.
Dos 43 indígenas assassinados neste ano, conforme dados
divulgados pelo Cimi, mais de 60% ocorreram no Mato Grosso do Sul, confirmando
a triste estatística de campeão de violência contra os povos indígenas. Com
certeza ações de reintegração de posse, além de ser um ato de violência em si,
propiciam o desencadear de mais violências e mortes. No Estado recentemente
três reintegrações de posse foram expedidas: Pueblito Kuê-Mbarakay (Iguatemi)
Kadiwéu (Bodoquena) e agora Passo Piraju (Dourados)
Nesta semana foi instalada em Amambai um grupo de 20
integrantes da Força Nacional, para evitar a violência contra a população
indígena em 12 municípios da fronteira com o Paraguai.Se espera uma ação eficaz,
especialmente em áreas em que as lideranças estão ameaçadas de morte,como em
Arroio Korá.
Comissão da Verdade Indígena
Até que enfim neste país se resolve começar a fazer
justiça,ou ao menos dar visibilidade, às violências, crimes, torturas e mortes
contra comunidades indígenas em todo o país, ocasionando milhares de mortes.
Embora tardiamente, e possivelmente contra a vontade de setores das elites do
país, à semelhança da Comissão Camponesa.
Para o ex-secretário
do Cimi, Saulo Feitosa a instauração de uma Comissão de Verdade Indígena, além
de um valor simbólico muito grande, traz em seu bojo a possibilidade ( e
necessidade) de uma reparação aos povos afetados.
Egydio Shwade e a Comissão da Verdade em Manaus estarão
entregando, na próxima semana um relatório com mais de 200 documentos
comprovando o massacre de mais de 2 mil Waimiri Atroari, por ocasião da
construção da estrada BR 194 que liga
Manaus(AM) a Boa Vista (RR). A estrada foi construída durante a ditadura
militar, nas décadas de 60 e 70.
Esse será um momento importante para esclarecer a morte de
mais de 1.500 Yanomami, em decorrência da invasão de seu território,
especialmente por garimpeiros e empresas mineradoras., na década de 80. Também
será o momento de esclarecer os massacres dos Juma (Tapauá-AM), do massacre do
paralelo 11, Cinta Larga, dentre muitos outros. Quem sabe se comece a
reescrever a história fazendo justiça a esses povos.
Egon Heck
-www.egonheck.blogspot.com.br
Povo Guarani Grande Povo
Cimi 40 anos, 9 de outubro de 2012